Organizado por um grupo de fotógrafos para vender fotografias de momentos da carreira política e da vida pessoal do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Leilão Lula Livre, realizado na noite desta quarta-feira (3), em São Paulo e em João Pessoa, arrecadou cerca de R$ 625 mil. O dinheiro será destinado ao Instituto Lula, que passa por dificuldades financeiras desde que o petista entrou na mira da Operação Lava Jato. Condenado em segunda instância pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, Lula completará no próximo domingo (7), um ano detido na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba.
O leilão teve todos os 50 lotes arrematados, cada um deles com uma fotografia doada por 43 fotojornalistas a pedido do grupo Fotógrafos pela Democracia. Levadas ao pregão por ordem do ano de antiguidade, de 1978 a 2018, as imagens de 30 centímetros de altura por 45 centímetros de comprimento foram impressas em papel algodão e levavam autógrafos de Lula, que as assinou na carceragem da PF em Curitiba. O evento havia sido iniciado na internet em meados de março, com lances mínimos de R$ 1.313,00 e teve ofertas presenciais, tomadas nas capitais paulista e paraibana.
Como a empresária Rosane Gutjahr, de 61 anos. Ela gastou R$ 227.800 em oito fotografias, que diz ter comprado em nome dela e de outras pessoas. O montante, correspondente a 36,4% do total das vendas, chega a R$ 239.190 se contabilizados os 5% de comissão a que o leiloeiro tem direito. Gaúcha radicada em Curitiba, dona de empresa em Manaus e assídua nos gritos diários de “bom dia”, “boa tarde” e “boa noite” a Lula do lado de fora da cadeia, Rosane não perdeu a viagem a São Paulo e venceu todas as disputas em que entrou no leilão. Todas as fotografias pelas quais deu lances, levou.
Se alguém a superava, Rosane imediatamente tratava de voltar à primeira posição, levantando a plaquinha e sinalizando o valor ao leiloeiro. Se o “rival” oferecia 100 reais a mais que ela, a empresária do ramo de eletroeletrônicos tratava logo de subir o lance em milhares de reais. Quando a compra era concretizada, fazia o gesto de “L” com os dedos indicador e polegar da mão esquerda e comemorava entoando “Lula livre”.
Ao menos três vezes foi honrosamente convidada pelo leiloeiro a bater o martelo com as próprias mãos, sinal de que seu lance havia quebrado o recorde da noite. “Você não sabe brincar?”, protestavam com bom humor outros presentes ao bar na Vila Madalena. Ela arrematou por R$ 40 mil uma foto da “sarrada no ar” de Lula ao lado de militantes da juventude do PT, clicada por Ricardo Stuckert em 2017; deu R$ 50 mil por uma imagem que mostra o petista sendo abraçado por militantes em Barbalha (CE), também feita por Stuckert em 2017; e fechou o leilão com um lance vencedor de nada menos que R$ 65 mil pelo último lote, uma fotografia de Paulo Pinto que mostra Lula sendo carregado por militantes no dia de sua prisão.
Admiradora do ex-presidente desde os tempos de sindicalismo no ABC paulista, Rosane Gutjahr alega, no entanto, que a única peça que sairá efetivamente de seu bolso e com ela ficará é a que mostra a assembleia de metalúrgicos no Estádio Vila Euclides, em São Bernardo do Campo (SP), em 1979, período em que Lula comandou greves na região. Clicada por Juca Martins, a imagem foi arrematada por R$ 20 mil. Sobre as outras sete fotografias autografadas que tanto lutou para levar, Rosane afirma terem sido adquiridas em nome de terceiros, que ela não revela quem são.
O pagamento do valor total, segundo a empresária, seria feito à vista no cartão de débito. Os compradores ainda tinham as opções de pagar à vista ou em três parcelas no cartão de crédito. Sobre a situação jurídica de Lula, com quem esteve pessoalmente duas vezes, “uma no Planalto e uma na rua”, a empresária confia na absolvição dele no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e critica o Supremo Tribunal Federal (STF), que deve reavaliar no próximo dia 10 a possibilidade de réus serem presos após condenação em segunda instância, caso do petista.
“O Brasil não tem uma Suprema Corte. Se tivesse, ele não estaria nem preso. Lula foi condenado por atos de ofício indeterminados, o juiz não soube tipificar qual crime o ele cometeu. Por que o STF mantém o Lula preso?”, indaga Rosane, que nunca foi filiada ao PT. Entre os lotes pelos quais a empresária não teve interesse e que puderam, assim, ser disputados e adquiridos por outros admiradores de Lula, foram arrematadas fotos do ex-presidente ao lado de líderes como Barack Obama (de Wilson Pedrosa, comprada por R$ 9 mil reais), Fidel Castro (de Luiz Prado, comprada por R$ 18 mil), Pepe Mujica (de Ricardo Stuckert, adquirida por R$ 12.100), Fernando Henrique Cardoso (de Helcio Toth, arrematada por R$ 6.600) e Leonel Brizola (de Cláudia Ferreira, comprada por R$ 9.500).
Algumas vaias chegaram a ser direcionadas à fotografia em que FHC aparece, tirada durante um debate na campanha presidencial de 1994. Também foram vendidas fotografias do início da carreira do ex-presidente como sindicalista, da posse dele na presidência da República e do dia de sua prisão, entre outros momentos.
Estiveram no leilão na Zona Oeste de São Paulo o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamoto, o ex-deputado federal e ex-presidente do PT José Genoíno, o deputado estadual Emídio de Souza (PT), o vereador Eduardo Suplicy (PT), o ex-secretário municipal de Cultura Nabil Bonduki e a ex-primeira-dama paulistana Ana Estela Haddad, mulher do ex-prefeito Fernando Haddad (PT). Mesmo estando em São Paulo, o escolhido para suceder Lula como candidato do PT na eleição presidencial de 2018 não foi ao Leilão Lula Livre porque, segundo Ana Estela, estava “resolvendo umas coisas fora”. Após o fim do leilão, Suplicy assumiu o microfone e cantou os clássicos Pela Luz dos Olhos Teus, de Vinícius de Moraes, e Blowin’ In The Wind, de Bob Dylan, uma de suas canções preferidas.