Raul Seixas, endiabrado roqueiro baiano, se vivo [morreu em agosto de 1989, aos 44 anos de idade], teria que remodelar a letra da música “Pare o mundo que eu quero descer”, de Sílvio Brito, aquela que diz: “tem que pagar pra nascer/tem que pagar pra viver/tem que pagar pra morrer”.
É que um projeto de lei que corre no Senado pode determinar que o condenado, enquanto encarcerado numa prisão brasileira, pague pela estadia com jornada de trabalho. Do contrário, se o detento for rico, será obrigado a quitar a dívida com o governo federal. E se, ao cumprir a pena, tentar aplicar o calote, ele terá o nome incluído na lista dos devedores.
Então, sancionado o propósito, além do cotidiano do xilindró, o sentenciado vai apropriar-se de uma salgada fatura: R$ 28,8 mil por ano se encarcerado numa penitenciária estadual, e R$ 42 mil anuais se detido em prisão federal.
Moka apresentou o projeto antes de deixar o Senado - Foto: Wesley Ortiz
O projeto é do ex-senador sul-mato-grossense Waldemir Moka (MDB), apresentado em 2015, quase quatro anos atrás e já aprovado em junho do ano passado pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça). A intenção que exige os presos a pagarem com trabalho ou dinheiro seu pelo período que ficar preso, agora, está perto de sair do papel.
Semana passada, o assunto foi tratado pelos senadores, em Brasília, e a proposta, com duas emendas incorporadas da senadora Simone Tebet (MDB), também parlamentar de MS, seguiu para a Comissão de Diretos Humanos e Legislação Participativa, colegiado comandado por outra senadora de MS, Soraya Thronicke (PSL).
Simone Tebet apresentou duas emendas ao projeto - Foto: Wesley Ortiz
Depois de examinada pela Comissão de Direitos Humanos, cuja presidente mostrou-se entusiasta pela cobrança dos presos, na última sessão, a proposta retorna ao Senado daqui 15 dias. Concordada pelos senadores, a ideia é mandada para a Câmara dos Deputados, daí, para virar lei, resta apenas uma canetada do presidente Jair Bolsonaro.
Em trecho do projeto é dito ser “imperioso observar que a grave situação do sistema prisional brasileiro decorre, principalmente, da falta de recursos para mantê-lo e do aumento progressivo e exponencial da população carcerária. A contribuição dos presos com o ressarcimento dos custos decorrentes da sua manutenção poderia ampliar esses recursos e propiciar uma melhoria no sistema”.
Soraya deve ajudar projeto a passar na Comissão de Direitos Humanos - Foto: Wesley Ortiz
Na justificativa do projeto é mencionado ainda que “estudos recentes apontam que um preso custa à administração pública cerca de R$ 2.400,00 por mês, valor que equivale ao que se gasta, em um ano, com um estudante de escola pública. De acordo com o Depen (Departamento Penitenciário Nacional), um preso nas penitenciárias federais pode ainda chegar a custar cerca de R$ 3.500,00 mensais”.
DÍVIDA ATIVA
A ideia original, de Moka, que não conseguiu a reeleição em outubro passado, era a de que o preso pagasse com o trabalho o período que ficar encarcerado.
A senadora Simone, contudo, apresentou uma emenda, que diz: “caso o preso que detenha condições financeiras de ressarcir o Estado dos custos da sua permanência nos sistemas prisionais, e não o faça, terá o saldo remanescente convertido em dívida de valor, com obrigação de pagá-la posteriormente”.
Complementa a senadora: “isto porque muitos presos que possuem condições econômicas e financeiras de pagar não pagam e acarretam gasto excessivo ao Estado, que já dispõe de escassos recursos para investimentos em diversas outras áreas de demandas prioritárias da sociedade, como educação e saúde, bem como projetos destinados à área de segurança pública”.
Ou seja, também segundo a emenda da senadora “na hipótese do não pagamento das despesas, dar-se-á a sua conversão em dívida de valor, aplicando-se lhes a legislação relativa à cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública”.