Uma vez sentado de frente para a lousa, em uma sala de aula cheia de alunos como ele, Edilmar Galeano Marques, 39 anos, já sentia fascínio em aprender e a vontade de sentir orgulho por suas conquistas através do conhecimento. Anos depois, passou para o outro lado da sala, na posição de professor, onde ficou mais conhecido como Bob, até se tornar diretor da escola onde estudou por boa parte da infância e adolescência.
Sua trajetória de vinte anos na educação tem um ponto muito claro marcado, os anos que considera ‘de ouro’ da curta vida do projeto que ficou conhecido como ‘Master’. Em entrevista abaixo, o professor conta um pouco sobre essa época e o que o mantém motivado e, essencialmente, sonhador, na rotina cheia de desafios de uma escola pública.
Como surgiu essa vontade de trabalhar com educação?
Tinha muita diferença as escolas de hoje e de antigamente, vejo nesses 20 anos, mas gosto sempre de citar um período em especial, no fim dos anos 80 e início de 90. Na década de 80 eu era aluno da rede pública e meu sonho era entrar no IECG, Instituto de Educação de Campo Grande, mais conhecido como Projeto Máster, e de fato o nível era outro, tudo diferente, várias atividades, teatro, tudo a disposição. Pela qualidade que eu via, o entusiasmo, me deu o start em trabalhar na área da educação, onde me graduei depois em matemática. Trabalhei por oito anos no colégio Dom Bosco, na UCDB e também na rede pública.
Como funcionava esse projeto?
Como o Projeto Master é tema de minha tese acadêmica, me aprofundei no tema. O professor trabalhava menos e recebia mais, tinha estudo, era integral, aluno fazia dois idiomas, estrutura imensa. Começou onde é o Museu dom Bosco, e o prédio foi inaugurado onde é a atual Escola Estadual Hércules Maymone, com grande índice de aprovação. Isso está escrito no primeiro capítulo dissertação de mestrado na Uems (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul) e foi um marco na educação, inovador, mas durou pouco, de 1989 a 1993, mas estava autorizado até 1997.
No Máster, você era especial, os melhores alunos das escolas públicas. Cessou porque mudou de governo, por questões estruturais e financeiras, consequentemente a interesses políticos. A lei mudou muito, não dá pra escolher apenas os gênios, mas algo parecido poderia ser ao menos estudado, um novo formato, abrangendo mais alunos.
E como começa sua trajetória depois dessa formação?
Fui aluno desse projeto, em seguida, virei professor e coordenador das salas de tecnologia, diretor pedagógico e depois diretor geral, por oito anos. Hoje estou no município, atuando como diretor e professor na escola Professor José de Souza, que entre várias iniciativas legais levou também o segundo lugar no prêmio de gestão, tem índice acima da média no Ideb 2017 (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), temos trabalho de reciclagem, ação social, de leitura, entre outros. Quando eu era diretor do Hércules, fomos à Febrace, fomos premiados diversas vezes.
O que a sua experiência como estudante o leva a acreditar tanto em iniciativas diferentes nas escolas?
Porque é preciso levar a educação além das salas de aula, das matérias curriculares comuns. Sentia que a escola (Hércules) era polo de referência em educação profissional e, lá em 2008 até 2011, verificaram que Campo Grande precisava de algumas profissões específicas, então criaram cursos integrados ao ensino médio ou subsequentes, em meio ao boom imobiliário e o comércio. Hoje os investimentos são menores, infelizmente.
Na época a escola era lotada, mas alunos terminavam o ensino médio, faziam ensino superior, faziam curso técnico ou graduação, mas voltavam pra fazer cursinho. Para evitar essa volta, criamos Serviço de Informação Profissional, o SIP. O ideal seria psicólogos, mas realizamos um trabalho de educação e orientação aos alunos concluintes do ensino médio, através de oficinas. O aluno preparado na escola é mais bem-sucedido.
E onde está, principalmente, essa desvalorização?
Existe muita evasão nas escolas, porque pessoas não sabem o que escolher, têm que trabalhar o quanto antes. No mestrado eu propus uma intervenção, um legado para a escola pública. Muitos desses projetos fantásticos são engavetados, mas estes podem ser desenvolvidos futuramente.
Professor valorizado não é só salário, mas uma estrutura inteira, qualificação, satisfação naquele ambiente. O que peca é nesse aspecto, que desanimam o profissional na rotina com desafios diversos. Precisamos mais pessoas que acreditem em boas iniciativas, até com pouco dinheiro.
Hoje a evasão aqui é baixa, temos que estar atentos e sermos cuidadosos com cada um, com a família.
O que seria uma escola ideal?
Hoje, seria um lugar que tivesse recursos humanos, guarda 24h, quadro completo de funcionários, estrutura adequada, valorização do professor, esportes, arte, comunidade inserida. Isso valoriza o bairro, a cidade, a sociedade. Uma rede toda funcionando, com apoio total do poder público. O resultado disso aparece nas avaliações externas.
E o que lhe ensina passar a maior parte de seus dias, há tantos anos, dentro de uma escola?
Passo maior parte do dia na escola, chego 6h30 até o último aluno sair, as vezes 19h30. Nosso país passa por tantas coisas difíceis, mas algo tem que ser feito, pouco a pouco já ajuda, sem ignorar a criança, o adolescente ou adulto, todos precisam de boa educação.
Por trás daquele pai desempregado ou mãe presa, existe uma criança que precisa de inclusão, com sonhos. É preciso entender o ser humano, direcioná-lo para o crescimento. A chave está no entendimento, equipe pedagógica que sabe aonde quer chegar, uma turma unida, muda governo e não há rompimento de projeto. Mantenho motivado o sonho, é preciso acreditar no trabalho, em dias melhores e que as coisas vão mudar.