28/09/2023 13:31
Top Literário: Emma usa hipérboles da vida real para criticar nossas relações com as redes
O drama de Adultos parece exagerado, mas tem muito mais ressonância na realidade do que gostaria
É difícil elogiar uma obra com uma personagem principal tão intragável, mas acho que é exatamente isso que torna Adultos, da autora Emma Jane Unsworth, tão interessante.
Jenny é uma millennial insuportável, narcisista, viciada em redes sociais e não consegue se concentrar por mais de dois segundos nas pessoas ao seu redor. Sim, ela tem alguns traumas e problemas justificáveis, mas se você chegou aos 30 anos sem nenhum BO pra chamar de seu, procure um médico que seu problema é amnésia. Ou alzheimer precoce. É algo real, eu juro, acabei de pesquisar no Google.
Não é muito difícil identificar o que deixa a personagem doente. Apesar de o meio ser as redes sociais, o sentimento que à leva a reações tão exageradas é bem mais comum e primitivo, a vontade de ser aceita pela sociedade. A internet mudou o paradigma, mas os humanos continuam movidos pelos mesmos tipos de sentimentos através dos séculos.
Apesar de chamar 'Adultos', no plural, a história se concentra na vida de uma mulher de 35 anos, cis, hétero e não racializada. Ela tenta aplicar o feminismo no cotidiano, apesar dos conflitos internos, sobre o que deseja, o que a sociedade impõe e sobre como ela quer ser vista no mundo, mas não me parece muito atenta a causas além do próprio umbigo. É bem amarga em muitas situações, mas não é essa a condição da existência?
O livro todo parece uma hipérbole sobre qual o ápice do absurdo que uma situação pode chegar, o que não significa que beira ao surreal. Pelo contrário, aposto que há muitas pessoas vivenciando as ações de todas as personagens retratadas na história neste momento.
A obra não tenta trazer uma pluralidade que saia do controle da autora, o que é outra qualidade que eu admiro. Um livro sobre 'como tentar agradar a todos o tempo todo não é saudável' tentando agradar a todos os públicos e todas as exigências do leitor moderno seria uma tragédia épica.
Emma se limita aos conflitos de uma pessoa apenas, através de seu relacionamento com a mãe, marido, amigas, colegas de trabalho, rivais, sem se embaralhar em tramas sem fim. É o que chamo de feito ao ponto. Um drama na medida para a reflexão.