Política

30/04/2021 19:00

Com projeto das licenças compulsórias aprovado, senador aposta em remédios mais baratos

Projeto visa obrigar fábricas a redução de preços sobre risco de quebra de patentes e foi aprovado ontem no Senado por 55 votos. Agora segue para votação na Câmara

30/04/2021 às 19:00 | Atualizado 30/04/2021 às 13:12 Rayani Santa Cruz
Senador Nelsinho Trad relatou o PL que obriga farmacêuticas a reduzirem preços de medicamentos - Pedro França/Agência Senado

De Mato Grosso do Sul, o senador Nelsinho Trad (PSD), é relator do projeto de lei das licenças compulsórias para remédios e vacinas contra Covid. A proposta, aprovada ontem (29), no Senado, deve funcionar como instrumento de pressão para forçar as farmacêuticas a negociarem redução de preços e transferência de tecnologia, para evitar a quebra de patentes.

Ou seja, ou elas cooperam com a redução de valores na venda dos produtos essenciais nessa época de pandemia, ou o país, por força da lei, poderá iniciar a fabricação desses medicamentos com a quebra de patentes. Para o senador, “haverá repercussão internacional se farmacêuticas não aceitarem lei em meio à pandemia de Covid”.

À Folha de São Paulo, o parlamentar explicou que mesmo que o país não consiga fabricar vacinas e remédios a curto prazo, a licença compulsória permitirá que o país importe genéricos. Bangladesh, por exemplo, fez licença compulsória do remdesivir, medicamento indicado para pacientes hospitalizados. O país conseguiu fabricar e vende a droga por um quinto do preço do original.

Trad afirma que o texto prevê negociação “civilizada” com as farmacêuticas, e que não teme retaliações. “Se elas não entenderem, nós vamos pagar para ver.” O substitutivo é baseado em dois PLs, um do senador Paulo Paim (PTRS), e outro dos senadores Katia Abreu (PP-TO), Otto Alencar (PSD-BA) e Esperidião Amin (PP-SC).

Medicamento

O substitutivo prevê licença compulsória do remdesivir, um dos únicos medicamentos aprovados pela Anvisa para tratamento de Covid. Nos EUA, o tratamento sai por US$ 520 (R$ 2.860) a ampola, ou cerca de US$ 3.120 (R$ 17,1 mil) o tratamento. 

“A partir do momento em que a lei for aprovada, o governo terá um instrumento para poder abrir um canal de negociação civilizada com quem detém a propriedade intelectual. Chama para a mesa e diz: o país está precisando desse medicamento, estamos aqui em uma situação de emergência, e precisamos que vocês baixem o preço, ou, então, nós vamos interferir na propriedade intelectual e passar a replicar esse remédio no Brasil. Foi o que fez o então ministro José Serra fez com o nelfinavir, um dos medicamentos contra HIV: ameaçou fazer licença compulsória e o laboratório acabou reduzindo em 40% o preço. Exatamente. Em função disso, nós ouvimos a assessoria do senador José Serra, e ele se manifestou favoravelmente ao substitutivo. Farmacêuticas de Bangladesh estão fabricando a versão genérica do remdesivir e vendendo por US$ 65 (R$ 357) a ampola, ou US$ 390 (R$ 2.145) o tratamento todo.”

O país, por ser parte do grupo das nações menos desenvolvidas (LDC), é autorizado a fabricar remédios patenteados sem autorização, e exportar para outros LDC ou países que tenham licença compulsória do medicamento. Essa lei permitiria ao Brasil comprar genéricos do remdesivir de Bangladesh.

Ministério da Saúde deve fazer sua parte

Trad explica que a lei prevê que, após decretação de estado de calamidade ou emergência, o Executivo tem 30 dias para apresentar uma lista de patentes cujas licenças compulsórias seriam necessárias. “Estabelecemos esse prazo justamente para que acenda a luz amarela no Ministério da Saúde, para listar os produtos que o Brasil comprovadamente tem a capacidade de desenvolver, e garantir que o processo de licença compulsória seja realizado de forma ágil e responsável.”

O parlamentar afirma também que se o governo federal dizer que “o Brasil não conseguiria fazer engenharia reversa [analisar um medicamento pronto e "desmontá-lo" para descobrir como foi feito e reproduzi-lo]” haverá necessidade de achar um caminho alternativo.

 “Achamos um caminho alternativo que faz com que recaia sobre os ombros do Executivo o ônus ou o bônus das ações. E nós estamos tentando acrescentar na lei algum outro instrumento para por mais pressão no Executivo, para que ele produza a lista. Estamos tentando achar um caminho para responsabilizar o Executivo. Nós, atravessando uma pandemia dessas, o número de mortos que temos, é absurdo se não houver iniciativa do Executivo. Se não fizerem nada, o ônus vai cair ainda mais nas costas dele.”

No caso de quebra de patentes e produção dos medicamentos no país, o senador cita o Instituto Butantan e a FioCruz como exemplos e afirma ainda que o desmonte de tecnologias no Brasil levou o país a “ir de pires na mão e implorar por insumos”.

O PL vai para a Câmara dos Deputados onde será votado e posteriormente, se aprovado para a sanção do governo federal.