23/08/2019 14:36
Governo é multado em R$ 90 milhões por se recusar a verificar agrotóxicos em água de MS
Governos Estadual e Federal devem aparelhar laboratório para análise periódica da água servida à população.
A Justiça atendeu pedido do Ministério Público Federal (MPF) e do Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MP/MS) e sentenciou os Governos Federal e Estadual a capacitar o Laboratório de Saúde Pública no Estado de Mato Grosso do Sul (Lacen/MS) para realizar a pesquisa periódica de resíduos agrotóxicos na água consumida pela população da região de Dourados, com mais de 200 mil pessoas.
A sentença, da 1ª Vara Federal de Dourados, estipulou ainda a cobrança de multa de mais de R$ 90 milhões, a ser paga pelo Governo Federal, por descumprimento de decisão liminar de 2016 que determinava a análise da água. O objetivo é apurar possível relação entre a contaminação da água por resíduos de agrotóxicos provenientes das lavouras e a saúde dos moradores, principalmente o aumento do número de casos de câncer registrado na região de Dourados..
A sentença determina o uso da multa, obrigatoriamente, na capacitação e aparelhamento do Lacen/MS, seja por meio de repasse vinculado de verbas ao Governo do Estado, seja pela aquisição direta e entrega de equipamentos. O objetivo é obter informações para subsidiar a tomada de decisões sobre políticas públicas voltadas à prevenção de danos à vida e à saúde da população.
Enquanto o Lacen/MS não estiver apto a verificar presença de agrotóxicos na água potável, a Justiça determinou que a União providencie análises mensais na água consumida pela população de Dourados, por laboratório habilitado e às suas custas, até que a condenação imposta na sentença seja cumprida.
Atualmente, a água potável da região vem do Rio Dourados e de aquíferos subterrâneos. A Justiça considerou “provável” a exposição da população a agrotóxicos através da água potável. Quando foi ajuizada, a ação citava laudo do Laboratório de Saúde Pública do Paraná (Lacen/PR), que analisou a água do Rio Dourados no período de janeiro a agosto de 2010. Foi encontrada a presença do inseticida, pesticida e formicida clorpirifós etílico (0,38 μg.L) e do larvicida temefós (0,05 μg.L). Não só o consumo de água com estes produtos é prejudicial à saúde, como também afeta a alimentação dos peixes do rio, que concentram altos níveis das substâncias nocivas.
Multa milionária
Decisão liminar de dezembro de 2014 determinou que as análises da água potável de Dourados deveriam ser feitas pelo Governos Federal e do Estado de MS, sob pena de multa diária de R$ 100 mil, até que se implementasse efetivamente a pesquisa de resíduos de agrotóxicos no Laboratório de Saúde Pública do Estado de Mato Grosso do Sul (Lacen/MS).
A Justiça considerou a data de 04/10/2016 como o início do descumprimento da decisão liminar. Ressalvados os períodos em que o processo ficou formalmente suspenso (27/04/2017 a 27/10/2017), a multa acumulada até 21/08/2019 chega a R$ 92.500.000,00.
População exposta aos agrotóxicos
Dados do Relatório Nacional de Vigilância em Saúde de Populações Expostas a Agrotóxicos, elaborado pelo Ministério da Saúde em 2018, apontaram que de 2013 para 2014, Mato Grosso do Sul apresentou o maior percentual de aumento da comercialização de agrotóxicos, em dados absolutos, com 102,2%. MS ficou em 4º lugar entre os estados que apresentaram o maior crescimento da comercialização de agrotóxicos por área plantada, com 24,31 kg/ha.
Nos Estados Unidos, em 2000, a Agência de Proteção Ambiental (EPA) concluiu que o agrotóxico clorpirifós oferece grande risco, principalmente sobre o sistema nervoso e o desenvolvimento do cérebro e o fígado. Desde então, o produto não pode ser comercializado para uso urbano no país, e os agrotóxicos que contenham a substância têm uso restrito.
Já no Brasil, o seu uso como desinfetante domiciliar foi restrito em 2004, cinco anos após o caso ocorrido em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, onde 112 funcionários do Grupo Hospitalar Conceição (GHC) foram fortemente intoxicados.
Já o temefós, usado pelo governo federal no combate à dengue, foi substituído pelo diflubenzuron (DFB) em 2001, depois de 34 anos de uso. Na agricultura, ambos são utilizados em todo o país.