Política

07/05/2019 12:37

MPF denuncia Wesley por uso de informação privilegiada pela 2ª vez

Operações financeiras feitas dias antes de a colaboração se tornar pública renderam quase R$ 70 milhões

07/05/2019 às 12:37 | Atualizado 07/05/2019 às 11:43 Globo
Marcelo Camargo, Agência Brasil

O Ministério Público Federal de São Paulo (MPF-SP) denunciou pela segunda vez o empresário Wesley Batista pelo crime de insider trading, que é o uso de informações privilegiadas para lucrar no mercado financeiro. A denúncia foi protocolada na Justiça Federal na manhã desta terça-feira (7).

Segundo o MPF, como gestor da Seara Alimentos e Eldorado Celulose, Wesley comandou operações de câmbio das empresas em maio de 2017, quando ainda estava sob sigilo o acordo de delação premiada que ele e o irmão Joesley Batista firmaram com a Procuradoria Geral da República (PGR) e executivos do grupo J&F.

Após a divulgação do teor das colaborações, o dólar teve alta expressiva, o que rendeu ao empresário quase R$ 70 milhões a partir dos contratos de dólar negociados dias antes, afirma o Ministério Público.

Em nota, o advogado de Wesley, Eugênio Paccelii, afirmou ser "incompreensível uma mesma pessoa ser denunciada duas vezes pelo mesmo ato".

"O objeto da denúncia oferecida pelo MPF é idêntico ao apresentado em 2017, processo no qual já foram entregues números auditados e contratos que refutam as acusações e comprovam que sequer os valores trazidos na denúncia são corretos. O empresário não tinha como saber quando a delação seria homologada pelo Supremo Tribunal Federal e, portanto, não poderia fazer uso dessa informação para fazer contratos de dólar. As acusações não sobrevivem a um levantamento minucioso do histórico do grupo no mercado financeiro. Já foi provado ao longo da instrução que tais operações eram típicas e fundamentais para o dia a dia das empresas, inclusive para garantir a boa performance financeira delas, cumprindo assim com o seu dever fiduciário", diz nota.

Ainda segundo o MPF, relatórios periciais da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e da PGR demonstraram transações atípicas realizadas pelo grupo.

No caso da Eldorado, os procuradores estimam que a empresa adquiriu contratos de dólar a termo (que já tem um valor futuro pré-determinado e não sofre variações) nos dias 9 e 16 de maio de 2017. O valor total dos contratos foi de US$ 280 milhões, equivalente ao triplo de todo o lucro obtido pela empresa no ano anterior, de acordo com a investigação.

Já a Seara efetuou a compra de US$ 25 milhões de dólar futuro (um contrato para compra da moeda estrangeira que considera ajustes diários do mercado de câmbio) entre os dias 10 e 16 do mesmo mês. A estimativa é que a quantia seja 50 vezes superior à média das operações que a empresa estava realizando no mercado cambial desde o segundo semestre de 2016.

Relembre

•            Em 17 de maio de 2017, foi revelado o conteúdo da delação premiada assinada por Wesley e Joesley Batista, da JBS

•            Dois dias depois, a empresa admitiu que comprou dólares na véspera do vazamento da colaboração

•            Após investigação do Ministério Público sobre o uso de informações privilegiadas na JBS e FB Participações, Wesley foi preso em setembro de 2017. Por causa dessa denúncia, Wesley já é réu por insider trading

•            Naquele mês, o irmão Joesley estava preso por supostamente omitir informações da delação

•            Em fevereiro de 2018, a prisão de Wesley foi substituída por medidas cautelares

•            Além de ações na Justiça, Wesley enfrenta processos administrativos da Comissão de Valores Mobiliários (CVM)

•            O MP pediu a rescisão da delação de Joesley e Wesley, que está sob análise do STF. Para o MP, os delatores agiram de má-fé e omitiram informações

Evidências

Na investigação mais recente sobre uso de informações privilegiadas, o MPF diz ter usado mensagens de texto entre Wesley e funcionários, analisadas a partir da apreensão do telefone celular dele, que comprovam que o empresário foi o mandante das operações.

As datas das operações cambiais coincidem com o período entre a celebração do acordo de colaboração premiada, no início de maio de 2017, e a divulgação do seu conteúdo, no dia 17.

Como isso, a cotação do dólar futuro teve alta de 9% no dia 18 de maio do mesmo ano, a maior elevação diária registrada em 14 anos, segundo o MPF. A Procuradoria diz que Wesley Batista sabia impactos que a divulgação causaria na economia do país, como a alta do dólar, e que de beneficiou disso para lucrar.

A segunda denúncia do MPF se baseia no artigo 27-D da Lei 6.385/1976, que prevê, em caso de condenação, pena de 1 a 5 anos de reclusão, além de multa de até três vezes o valor da vantagem ilícita obtida com o crime.

Essa lei define a prática do insider trading como “utilizar informação relevante de que tenha conhecimento, ainda não divulgada ao mercado, que seja capaz de propiciar, para si ou para outrem, vantagem indevida, mediante negociação, em nome próprio ou de terceiros, de valores mobiliários”.