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06/11/2019 11:33

'Movimento feminista colaborou para degradação moral que vivemos', diz juíza em ação contra trote

Ação Civil Pública foi ajuizada pelo Ministério Público contra ex-universitário que conduziu juramento em trote do curso de medicina

A juíza Adriana Gatto Martins Bonemer, da 3ª vara Cível de Franca, em São Paulo, julgou improcedente a Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público de São Paulo.

De acordo com informações do Migalhas, um ex-universitário participou do trote do curso de medicina, conduzindo um juramento com expressões pejorativas e de cunho sexual. Na decisão, a magistrada fez críticas ao feminismo e disse que a inicial do MP retrata "panfletagem feminista".

O caso

Em fevereiro de 2019, estudantes do curso de medicina de uma universidade particular de Franca aplicaram um trote aos calouros da instituição. O vídeo circulou pelas redes sociais e ganhou repercussão nacional, as imagens mostram calouros ajoelhados em uma rua repetindo um "juramento", lido em voz alta pelo ex-universitário.

O texto continha expressões pejorativas dirigidas a alunos de outros cursos e outras faculdades, bem como incitações de cunho sexual atribuídas, em especial, às calouras do curso. "Repudio totalmente qualquer tentativa deles se aproveitarem e me reservo totalmente a vontade dos meus veteranos e prometo sempre atender aos seus desejos sexuais. Compreendo que namoro não combina com faculdade e a partir de hoje sou solteira, estou à disposição dos meus veteranos. Juro zelar por suas reputações, mesmo que eles sejam desprovidos de beleza ou cheire a ovo vencido. Juro solenemente nunca recusar a uma tentativa de coito de veterano (inaudível...) mesmo que ele cheire cecê vencido e elas, a perfume barato", dizia um trecho do texto repetido pelos universitários.

Após a divulgação do vídeo, a instituição repudiou qualquer ato que incite preconceito, homofobia, machismo, discriminação e constrangimento, além de afirmar que os estudantes responsáveis pelo trote seriam identificados e penalizados. A associação atlética do curso e o centro acadêmico pediram desculpas e alegaram que o texto não havia sido escrito por nenhuma das entidades.

Ação Civil Pública

O Ministério Público de São Paulo ajuizou a ação, alegando que o jovem se aproveitou do momento de comemoração dos aprovados no vestibular para fazer com que os calouros entoassem, "durante o trote universitário, a pretexto de se tratar de hino, expressões de conteúdo machista, misógino, sexista e pornográfico, expondo-os à situação humilhante e opressora e ofendendo a dignidade das mulheres ao reforçar padrões perpetuadores das desigualdades de gênero e da violência contra as mulheres".

Para o MP, a prática reforça o machismo e coloca a mulher em posição de inferioridade, reproduzindo ideias que remetem à cultura do estupro, estimulando agressão e violência. O órgão requereu a condenação do ex-acadêmico por danos morais coletivos e danos sociais.

O requerido alega que o fato não passou de um trote universitário e, inclusive, a própria irmã havia participado; não tendo "dentro de si ânimo de ódio, discriminação ou preconceito contra as calouras ali presentes, nem contra as mulheres em geral". Segundo o rapaz, não há que se falar em dano moral coletivo, pois embora algumas pessoas tenham se manifestado contra o juramento, não ficou comprovado que tenham sofrido com a divulgação do evento.

Decisão

A juíza transcreveu o juramento e observou ser pública e notória a prática, nas universidades, de recepção aos recém-aprovados, marcada por festas e comemorações, que muitas vezes ferem o bom-senso e a moral, como no caso em questão.

No entanto, entendeu que não se vislumbra a existência do pretendido "coletivo" de mulheres no caso, visto que "os indivíduos do sexo feminino não são iguais e não possuem os mesmos valores daqueles descritos na inicial". A juíza ponderou que o pedido do Ministério Público "retrata bem a panfletagem feminista, recheada de chavões que dominam, além da esfera cultural, as universidades brasileiras". Citou ainda diversas obras de escritoras feministas e teceu críticas ao movimento.

"É bom ressaltar que o movimento feminista apenas colaborou para a degradação moral que vivemos, bem exemplificada pelo "discurso/juramento" que ora se combate. Estamos vivendo a degradação moral e a subversão das identidades, de onde advém comportamentos como aquele descrito na inicial. Diante dos usos e costumes instalados na sociedade, promovidos pelo próprio movimento feminista, entender ofensivo o discurso do requerido é, no mínimo, hipocrisia."

Por entender que não se pode presumir que o comportamento do ex-universitário, "dirigido a um grupo específico de pessoas, seja uma agressão dirigida a todos os indivíduos do sexo feminino", julgou improcedente a Ação Civil Pública.

"Aliás, se a questão fosse mesmo de proteção à dignidade da mulher, por qual motivo seria irrelevante a opinião das mulheres que estavam no local, tal como consta na inicial? Seriam tais mulheres incapazes de entender o caráter dos fatos e de determinar-se de acordo com tal entendimento? Ou, se as mulheres que lá estavam são plenamente capazes e concordaram com a brincadeira infeliz, por que precisam de um ente estatal para falar em nome de uma 'coletividade' da qual, em tese, fazem parte, mas de cujas ideias discordam? Seriam tais mulheres menos capazes que as outras?"

Os advogados Carlos Ernani Constantino e Rafael Vitor Constantino atuaram em defesa do ex-universitário.

Processo: 1020336-41.2019.8.26.0196

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