O pesquisador e investidor Eduardo Moreira, alvo de ataques de políticos de Dourados após dizer que os indígenas estavam passando fome em uma entrevista, foi o percursor de uma ação que arrecadou R$ 500 mil para projetos estruturantes em aldeias do município e doações de alimentos. O presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-MS e coordenador do curso de Direito da UFGD, o advogado Tiago Botelho ingressou na organização do projeto que, nesta sexta-feira (6), distribuiu 330 cestas básicas para as famílias indígenas.
Cada família recebeu cinco cestas básicas. Essa é a segunda ação do grupo e na primeira foram distribuídas 100 cestas básicas na área retomada Yvu Vera. O advogado explica que as cestas tiveram acompanhamento nutricional.
"Eu enquanto presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-MS e coordenador do curso de Direito da UFGD entrei em contato com o Eduardo Moreira e me coloquei em solidariedade a ele. Nós passamos a construir lives e sugerimos que fosse organizado uma arrecadação. Em uma semana arrecadamos R$ 500 mil e formamos um comitê gestor que é composto por 50% de indígenas e 50% de não indígenas para gerir esse valor." "Nós doamos uma cesta de alimentos, uma de frutas, verduras e legumes, uma de produtos de limpeza e outra com frango e ovos para contemplar toda a família. Eles receberam uma muda de árvore para fazer o plantio na reserva e ajudar no reflorestamento."
(Cestas básicas foram distribuídas. Foto: Arquivo Pessoal)
Botelho explica que as duas maiores aldeias do Brasil, Bororó e Jaguapirú, foram acalentadas com a ação. A seleção dos beneficiados foi realizada através de agentes de saúde que ajudaram a encontrar famílias que não recebiam benefícios do governo. A ideia era atender os mais vulneráveis e que não tinham quaisquer auxílios.
"Na minha percepção como advogado é que essa ação mostra para o município, Estado e o para o Brasil que existem pessoas que apoiam a causa indígena e sim, existem pessoas que passam fome. É um recado para os representantes e para os políticos de que é preciso fazer algo. Primeiro, é preciso demarcar à terra indígena. Não há o que se falar de fome sem falar em demarcação das terras indígenas. E depois garantir os demais direitos que é: o direito a alimentação, o direito a água, a cultura, a escola. Comer é um direito de todos! E os indígenas estão tendo esse direito negado. Em Dourados os indígenas passam fome aos olhos nus. As pessoas sabem disso, os indígenas reviram o lixo. A ação de ontem, é uma ação de denúncia e mostra ao Estado que ele precisa se atentar e cuidar dos direitos dos povos indígenas."
Projetos estruturantes
Ainda conforme Botelho, o Comitê gestor destinou R$ 150 mil para a compra de cesta básica e a partir de agora serão pensadas ações estruturantes como a perfuração de poços, já que os indígenas não possuem esse acesso básico. Construção de horas e galinheiros para dar estrutura alimentar. "Vamos iniciar essa outra fase do projeto que é a ação estruturante."
Eduardo Moreira parabenizou a iniciativa de Botelho e destacou que o número alto de voluntários no projeto mostra que é ações como essa são fundamentais. Ele elogiou a organização do projeto.
"Que alegria ver esse pontapé inicial de maneira estruturada, grande e entusiasmada que começaram o projeto. Destacando em primeiro ponto os voluntários, segundo a organização que é importante fazer com que tudo fosse planejado com compra, distribuição. O terceiro pronto é a representatividade do Comitê, bem distribuído entre os irmãos indígenas. Os movimentos sociais e o lado representativo da OAB, e do direito humano é outro exemplo. Por fim, mas não menos importante é o conceito de economia solidária, ou seja, a construção de riqueza na comunidade."
Moreira destacou a produção de pequenos agricultores, na compra e venda local que faz com que a riqueza passe nas comunidades indígenas e fique no local. "A mensagem final é que a gente mostrou, que dá para transformar o ódio, o ataque e a intimidação em um elemento de coesão e motivação para a solidariedade, enfrentamento e resistência de tudo isso que está acontecendo no Brasil. A gente não pode ver os irmãos indígenas na miséria, como ocorre em Dourados e a poucos quilômetros de distância ver criadores de cavalos com pista de avião, suas fazendas e etc, e achar isso normal. Isso não é normal e é fácil fazer é só mudar aprioridade para esses que estão vivendo na miséria."
Polêmica
No mês de maio, o pesquisador e investidor Eduardo Moreira enviou moção de repúdio se defendendo de ataques de políticos da cidade após fazer as denúncias relacionadsa as péssimas condições em que vivem os indígenas em Dourados/MS. O pesquisador foi até ao município em novembro de 2020. Ele aponta que essa é a 10 denúncia dele contra maus-tratos aos povos indígenas.
Ele escreveu uma carta aberta para Alan Guedes, prefeito da cidade de Dourados e Marçal Filho, deputado estadual no Mato Grosso do Sul pelo PSDB.
O prefeito e o deputado não teriam gostado das declarações dadas pelo pesquisador durante entrevista à jornalista Leda Nagle, ao início do mês de maio.
“Denunciei mais uma vez as violências que presenciei ao morar em uma semana nas aldeias indígenas da região de Dourados. No período em que lá estive, presenciei atrocidades que jamais havia visto em todas as viagens que fiz para morar nas regiões pobres e em conflito deste nosso continental país”.
Na carta, o pesquisador destaca que em todas as oportunidades que teve de fazer estas denúncias, sempre recebeu espanto e interesse de ajudar aos que sofrem.
“Nesse sentido fiquei surpreso pelas manifestações de V.Exas. não terem sequer mencionado as violências que denunciei contra os irmãos e irmãs Guaranis Kaiowás. Aliás, chegam mesmo a ser negadas. Cria-se uma narrativa de que eu ofendi o povo de Dourados, gratuitamente”, se defendeu.
Além da carta, o pesquisador desabafou em vídeo no seu canal do YouTube, que recebeu ameaças após a denúncia. Confira: