Suspeita de fraude num processo licitatório por meio do conhecido pregão presencial, regulado pela prefeitura de Brasilândia, no fim do ano passado, vai parar na Justiça.
Motivo: empresa de Campo Grande venceu a disputa, foi anunciada em Diário Oficial como a melhor proposta, mas, depois, por influência de uma concorrente, cujo dono é prestador de serviço da prefeitura, o certame foi extinto, ou seja, a concorrência, embora propagandeada pelo município, deixou de existir.
O serviço disputado era pela contratação de empresa especializada para prestação de serviço de levantamento e criação da base geodésica da cidade. O trabalho é o mesmo que uma sondagem topográfica, que determina os pontos de referência que ajuda a situar os elementos do terreno.
Representante da empresa vencedora, a TOPX Topografia, Douglas Centurião, consultor empresarial, disse ter notado anormalidade na concorrência logo no início. Para disputar o serviço, a prefeitura de Brasilândia exigiu que o engenheiro agrimensor responsável pela empresa devesse ter concluído o curso de especialização em nível de pós-graduação. Para Centurião, a exigência seria desnecessária: “isso [pós-graduação] não consta no artigo da lei 8.666, que é a lei das Licitações”.
O consultor revelou que “informalmente” foi ao Tribunal de Contas, em Campo Grande, saber se, de fato, era preciso ter concluído a formação acadêmica em questão para participar do certame.
A corte, disse Centurião, também informalmente teria, por telefone, avisado a prefeitura de Brasilândia que a pós-graduação exigida, por regra, não era obrigatória. O município, em seguida, acatou a orientação e tirou a cláusula. “A prefeitura reabriu a licitação sem a exigência”, disse o consultor.
Daí, em 5 de dezembro do ano passado, a prefeitura promoveu o pregão que envolvera quatro empresas: a TOPX, Topsat Ambiental, US Serviços de Engenharia e a Sucess. Venceria a empresa que apresentasse a menor proposta, cujo valor do serviço fora fixado em R$ 188.247,00. Ganhou a licitação a TOPX com o lance de R$ 128 mil.
Já perto de assinar o contrato com a prefeitura, segundo o consultor, a Sucess ingressou com recurso pedindo a anulação da disputa. Douglas Centurião sustentou em sua defesa que a empresa empresa perdedora protestou o resultado fora do prazo, ou seja, depois de cinco dias do desfecho da concorrência.
“Logo em seguida recebemos e-mail da prefeitura dizendo que a licitação tinha sido cancelada e nem nos deram o direito ao contraditório e ampla defesa, como exige a lei”, contestou Centurião.
Inconformado, o consultor foi à prefeitura de Brasilândia entender as razões do cancelamento. Lá, disse ele, descobriu que a empresa que manifestou-se pela anulação do certame, a Sucess Sistemas de Gerencialmente Eirelli, propriedade de Celso Rubens Smanioto, com sede em Campo Grande.
“Entrei em todas as salas da prefeitura e, numa delas, vi o Celso [dono da Sucess] cumprindo expediente dentro do núcleo de contabilidade, onde todas as licitações passam antes de acontecer”, afirmou Centurião.
O consultor disse ter descoberto que Smanioto cuida de um sistema que controla as finanças do município por meio de contrato anual no valor de R$ 140 mil.
Para provar sua descoberta, Centurião filmou o dono da Sucess sentado numa das mesas da repartição. "Chamamos uma tabeliã e fizemos uma ata notarial atestando que o mesmo [Celso] estava trabalhando dentro da prefeitura, com espaço, mesa e computador. Tudo certinho. (ver vídeo nesta página)
Para Centurião, Smaniotto não poderia entrar na concorrência por conhecer os planos financeiros do município, incluindo os processos licitatórios
Agora, o consultor prepara um mandado de segurança para garantir o serviço no município conquistado pelo pregão presencial. “Isso [suspeita de fraude] é um ato de improbidade administrativa, é um conluio, um mini cartel”, afirmou.
PREFEITURA NEGA
A assessoria jurídica da prefeitura de Brasilândia discordou do consultor sobre a exigência de o dono da empresa concorrente ser pós-graduado. Luciane Palhano afirmou que o município retirou a exigência por iniciativa própria, não por orientação do Tribunal de Contas, como disse Douglas Centurião.
Luciane narrou que no recurso, a Sucess pediu a anulação do certame porque a TOPX teria recebido “com exclusividade informação de suma importância para a elaboração da proposta, imperioso o reconhecimento do vício insanável”.
Ou seja, o responsável pelo pregão presencial mandou, por e-mail, informação sobre a licitação apenas para a TOPX, não para as outras concorrentes.
Centurião admite que fez questionamentos ao pregoeiro, mas que isso poderia ter sido feito também pelas empresas que entraram na disputa.
O questionamento tinha relação com o Sistema de Informação Geográfica.
Diz o recurso da Sucess, que pediu a anulação: “Em resposta, o Ilmo. Pregoeiro disponibilizou a informação que o mesmo [serviço] não precisaria ser desenvolvido em uma plataforma WEB (SIGWEB). Esta informação deveria ter sido repassada a todos os participantes cadastrados previamente a Licitação, para melhor esclarecer o desenvolvimento da ferramenta SIG, pois supõe-se na atualidade que a consulta e uso dos dados vinculados a um SIG Multifinalitário se fariam usando a internet para permitir o compartilhamento de dados e geração da informação georreferenciada”.
De lado o argumento técnico, para o dono da Sucess, com a informação, a TOPX pode reduzir o lance na hora do pregão e que se soubesse o dado especificado pelo pregoeiro também poderia baixar o valor de sua proposta.
A advogada Luciane Palhano admitiu que o empresário Celso Smaniotto mantém contrato com a prefeitura, mas não no setor de licitações. Ela afirmou também que, por lei, o dono da Sucess, mesmo atuando pela prefeitura, poderia entrar na disputa em questão.
Luciane contou que é intenção da prefeitura de Brasilância em retomar a licitação anulada ainda neste ano.
Celso Smaniatto, o que tem contrato com a prefeitura, é engenheiro cartográfico, mestre em ciências cartográficas e professor de universidade.
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