A foto de um banco de ônibus com uma mancha vermelha, que se parece com sangue de menstruação, se espalhou pelas redes sociais na última semana. A publicação da página de Facebook ‘Segredos do Busão CG’ garante que o registro é no transporte coletivo de Campo Grande.
Bastou a postagem da foto e legenda: “Gostaria de saber, quem é a princesa que marcou com sangue, o assento de prioridade da linha 408 Jd Aeroporto!!! Aparece aí cremosa”, para a polêmica ser instaurada. Entre quem condenou o julgamento à pessoa que teria provocado a mancha e quem chamou o caso de ‘pura falta de higiene’, a discussão foi longe.
“Um absurdo, eu por exemplo sempre escolho os locais onde vou menstruar. Acordo e penso. Hoje é um dia ótimo para minha menstruação descer sem eu saber e manchar o banco do ônibus. Tudo programado por mim”, ironizou uma mulher nos comentários.
“Ao invés de querer saber quem é a ‘cremosa’, por que não questiona a limpeza dos ônibus?”, analisou outra usuária da rede social.
Há quem questionou hábitos de limpeza da suposta passageira. “Pessoas, vamos ter o senso aqui, cadê a higiene do ser humano? Desde pequeno sabemos a higiene, se sabe que sangra usa o ca* do absorvente”, bradou um homem no debate.
Após a repercussão, a administração da página publicou retratação sobre a postagem, garantindo que o espaço é livre para discussões e que não incitou críticas às mulheres.
Mas afinal, qual o motivo do tabu?
O ano é 2019 e o assunto 'menstruação' ainda não é tratado sem eufemismos como uma unanimidade, ou seja, na maioria das conversas em que surge. Fato é que toda pessoa com órgãos reprodutores femininos saudáveis, como classifica a medicina, passa pelo ciclo menstrual em que, se não há concepção da gravidez, há liberação de sangue.
Se é biologicamente natural, por que não é socialmente naturalizado? A cientista social Nathalia Eberhardt Ziolkowski, 33 anos, estuda e participa de discussões sobre o assunto com outras mulheres, analisando o contexto histórico do tabu.
"A menstruação não é nada exclusiva, todo mundo conhece, mas isso não diminui o impacto causado quando a gente trata do tema em público, e sobre o corpo e vivência da sexualidade feminina como um todo. Essa coisa de que o sangue menstrual é sujo, ligado à falta de higiene, está associado ao pensar sobre a mulher, que é o ponto que me remete ao pertencimento de si da mulher cisgênero" analisa a integrante da AMB (Articulação de Mulheres Brasileiras), movimento social feminista nacional e apartidário.
Ela também associa o senso geral como um reflexo do julgamento histórico de uma fertilidade não aproveitada. "Nosso papel está associado à procriação, a menstruação incorporada imaginário social com esse simbolismo. Recaem daí outros montes de ideias negativas sobre a menstruação, mas outras culturas não ocidentais têm relações diferentes sobre o assunto", finaliza.