Quase 10 meses após o nascimento, as gêmeas siamesas Lara e Larissa deixaram o hospital pela primeira vez nessa quarta-feira (6/8), em Goiânia (GO). O caso delas é considerado um dos mais raros do Brasil e, por isso, desafia os médicos, que ainda não conseguem prever quando será possível separá-las.
Desde que nasceram, as irmãs enfrentaram uma série de complicações. Elas chegaram a ficar mais de cinco meses na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e passaram por várias intercorrências. Só agora as pequenas estabilizaram o quadro de saúde, a ponto de receberem alta e poderem ir para casa.
As recém-nascidas são unidas pelo tórax e compartilham vários órgãos, como fígado, intestinos grosso e delgado, genitálias. Elas evacuam pelo mesmo orifício. Além disso, as irmãs possuem apenas três pernas – cada uma delas tem uma e a terceira, segundo a equipe médica, sai pelas costas.
(Foto: Kátia Márcia Cardoso/Metrópoles)
A mãe, Kátia Márcia Cardoso, de 37 anos, é quem acompanha as filhas desde o início. Ela é paraense, vivia com a família em Parauapebas (PA) até descobrir no ano passado que as filhas nasceriam siamesas e que, por isso, precisariam de tratamento especial.
Antes mesmo do parto, a mãe buscou auxílio junto ao médico goiano Zacharias Calil, que é reconhecido internacionalmente por fazer cirurgias em crianças siamesas. Com mais de 30 semanas de gestação, Kátia se deslocou para Goiânia, em setembro de 2023, e as filhas nasceram no dia 11 de outubro.
“Minha vida, desde então, foi dentro do hospital. Agora, consegui alugar um apartamento perto, a 1 km do hospital, graças à ajuda de algumas pessoas, e vamos viver por aqui, pois elas continuarão em observação. O que eu puder fazer para elas não voltarem para o hospital eu vou fazer”, diz ela.
Zacharias Calil explica que ainda não é possível que as gêmeas retornem para o Pará. Elas terão de seguir em Goiânia pelos próximos anos, até que atinjam as condições necessárias para serem submetidas ao procedimento de separação.
“Ainda não temos previsão de quando isso acontecerá. É um dos casos mais complexos que já peguei. Larissa tem cardiopatia, precisa de oxigênio para respirar, portanto é um quadro muito delicado. Só de conseguir a estabilização necessária para retirá-las do hospital já é uma vitória”, afirma o médico.
Caso raro
Siameses unidos pelo tórax estão entre os casos mais raros da pediatria e, por isso, também estão entre as cirurgias infantis mais complexas de todas. Apenas 2% dos siameses apresentam essa configuração. Eles só ficam atrás de crianças unidas pela cabeça, que correspondem a 1% dos casos.
Durante os meses de internação no Hospital Estadual da Criança e do Adolescente de Goiás (Hecad), Lara e Larissa tiveram paradas cardiorrespiratórias, úlceras de pressão, traqueíte, hipertensão pulmonar, distúrbios hidroeletrolíticos e outros. Além disso, segundo a unidade de saúde, elas têm síndrome do pé torto congênito e se alimentam por sonda.
Kátia, a mãe, diz estar esperançosa e confiante na possibilidade de separação das filhas. “Sofri quando descobri, porque é algo que a gente nunca espera, mas estou preparada para enfrentar tudo”, diz ela. Cada uma das gêmeas pesa, hoje, em torno de 3,9 kg.
Zacharias Calil, que já fez 22 cirurgias de separação em siameses, diz que ainda não enxerga possibilidades em curto prazo, a não ser que surja alguma emergência. “Elas precisam ganhar peso, ficar mais resistentes e passar por avaliações periódicas”, explica.